Luz e Sombra

Sunday, March 27, 2005

"Only Pain is Real"; 500 palavras para um blog

Sempre que olho para ti vejo atrás da máscara séria, uma alma torturada e infeliz.
Tento descortinar o que se terá passado para chegares a este ponto de decadência humana... Encontro-te sempre com uma cerveja na mão e um cigarro. Mais do que o teu orgulho, a tua ruptura com a sociedade impede-te de pedir alguma coisa a alguém, seja comida, cigarros ou abrigo. Por isso é frequente encontrar-te à procura de beatas nas bermas dos passeios! Alheado de tudo o que se passa à tua volta, não reparas nos olhares de desprezo, nojo e pena que as pessoas te lançam fulminantemente, sofrerias ainda mais se te desses conta!
Gostava de saber do que foges, do que tens medo?O teu sofrimento é atroz, os teus olhos fundos e cavos não escondem a depressão em que vives mergulhado! Tentas aliviar a dor com analgésicos. Onde os arranjas, se não tens dinheiro e não pedes nada a ninguém? nunca consegui descobrir! És de parcas respostas e eu não insisto! não és perfeito, mas quem é? neste mundo de dor e podridão. Achas que a solução para Aquilo que te consome a vida é fugir? E não te desculpes com um “sou uma pessoa muito sozinha”, se tu amas a solidão e procuras nela o refúgio para continuares a alimentar a tua dor e o teu sofrimento, se tu afastas-te todos à tua volta! Não sei porque ainda finges um sorriso na cara quando me vês se os músculos e expressão te traem a toda a hora com uma tristeza profundamente cravada ao longo dos anos. Sentes-te a andar à roda numa cadeira e não consegues pará-la, falta-te oxigénio para conseguires aguentar mais um dia, mas cá continuas e sempre nesse estado mórbido, com as sensações anestesiadas pelo alcool e cigarros. A verdade é que queres que a sociedade te bata e magoe porque estás enamorado da dor e já não sabes viver sem ela. Dizes-me que respirar é a única coisa que te mantém vivo e já não tens control sobre nada, afastas-me porque não queres que eu me afunde contigo. Só que não percebes que já fazes parte de mim e da minha vida e que simplesmente não me posso ir embora como se nunca te tivesse conhecido. Maldito sejas! Enebriado na tua dor nem sequer consegues olhar para o lado!? Perdes-te o respeito dos teus pais, foste despedido do emprego, afastas-te todos os teus amigos e agora queres me afastar também?. Mas eu não desisto de ti, continuarei cá, não para alimentar a tua dor mas para te fazer acordar para a Vida. Guardo a esperança de um dia saires do inferno maldito em que te afundas-te. Construis-te muros à tua volta e quando eu tento passar repeles-me violentamente mas depressa desistes... afinal sou eu que tento manter alguma conexão entre ti e o real! Estás feito num farrapo vadio, sem rumo nem eira vagueias por aí o dia todo.
Espero pelo dia em que voltarás a sorrir novamente...

8 Comments:

  • Anathema - "Alternative 4" (1998)

    4. Lost Control

    Life.. has betrayed me once again
    I accept that some things will never change.
    I've let your tiny minds magnify my agony
    and it's left me with a chemical dependency for sanity.

    Yes, I am falling... how much longer 'till I hit the ground?
    I can't tell you why I'm breaking down.
    Do you wonder why I prefer to be alone?
    Have I really lost control?

    I'm coming to an end,
    I've realized what I could have been.
    I can't sleep so I take a breath and hide behind my bravest mask,
    I admit I've lost control
    Lost control...

    By Blogger Der Überlebende, at 3:56 PM  

  • mas que bonito texto!
    menina, isto bateu cá no fundo...
    ha momentos em que cada um de nós se sente assim perdido, tendo apenas por companhia aquilo que nos corroi, talvez porque nos queremos corroer!

    adorei este texto, adorei a sensibilidade, a força, a tristeza, o drama, a intensidade!
    a simulação do sorriso, a esperança vencida...a dele não a tua!

    By Anonymous Anonymous, at 9:53 PM  

  • adorei o texto, deixei-me perder nele, retrata muito do que vejo e enfrento todos os dias, não necessariamente sob a forma de um homem, bebida e cigarros, mas exactamente isso, essa dor, essa magoa, essa indiferença, essa sombra no olhar que cega quem vê e bloqueia quem tenta ver. confesso que sempre pensei ser possivel dar a volta, que com força de vontade tudo poderia voltar a ser colorido e belo como nos contos de fadas. entendo agora que não é bem assim.. quantas vezes disse adeus, enxotei alguém de perto de mim, fugi, me deixer adormecer à vida quando o que mais queria era rir, nao estar sozinha, nao ser assim, dar a volta. enfim como diz Pessoa: "Nós nunca nos realizamos. Somos dois abismos - um poço fitando o Céu." não me consigo evadir do poço, apenas desfrutar dos breves momentos em que vislumbro o céu, o sol e o tempo existirem livres lá fora.

    em relação ao comentário do Der Uberlende, acho soberbo, Anathema diz-me mais que talvez todas as bandas com que tenha tido contacto até hoje em todos os niveis. essa é sem dúvida uma música marcante, com uma melodia à medida do teu texto. [não me vou alongar com o que essa música representa em particular para mim e com o que poderia representar num todo, nao me parece necessario]

    apenas mais uma pequena nota, agradeço sinceramente o convite do Der Uberlende a fazer parte do vosso desafio e o seu comentário em tudo elogioso, muito obrigada :) no entanto sou obrigada a dizer que não entendo a razão dos mesmos.. a minha escrita não passa de infantil. mesmo assim tenho a dizer que o ego agradeceu :) poderia tentar escrever qq coisa mas sinto-me vazia e além disso incapaz de produzir um texto suficientemente bom para estar aqui. [lá está abandonei o projecto antes de o iniciar como diz Pablo Neruda, eu morro lentamente e não sei dar a volta, ou talvez.. nao queira dar a volta, acomodei-me nesta "forma" de existir.]

    beijinhos a todos ******
    e desculpem o "testamento" com coisinhas de pouca relevancia

    By Blogger Perséfone, at 1:03 AM  

  • Cara Perséfone,
    Se voltares a escrever comentários como o que dedicaste a este inquietante texto da booklover e insistires em minimizar o impacto e a importância das tuas palavras garanto-te que me "zango" contigo!
    E uma pessoa que escreve a seguinte passagem: " De dedos espasmáticamente esticados tentei alcançar o pão [acho que só o fiz cá dentro, incrível a quantidade de coisas que idealizámos cá dentro e que simultaneamente pensamos ter realizado lá fora sem o termos feito] " devia de ser obrigada por lei a participar no Desafio 500.
    Nunca duvides da importância dos teus sentimentos, das tuas palavras, nem das tuas acções. No melhor e no pior, tu és única e inegualável, irrepetível durante todo o ciclo de vida do universo, assim como cada uma das pessoas que encontramos. Daí doer tanto que alguém se perca no "caminho" (como a personagem deste texto). Só percebemos que realmente existimos quando a dor se torna demasiado real, demasiado íntima e próxima. Insistimos demasiadoem ser personagens de nós mesmos, e tememos despir a carne e expor a alma. Não tenhas medo, não há nada a temer para além de existir e ser-se "nada". Sê tu mesma. Que ninguém te possa tirar esse dom.
    E quanto a Anathema, para mim representam de uma forma demasiado crua e sublime aquilo que mais nos faz transcender: a triologia amor - dor - ser. Em suma e sem mais preciosismos inuteis de linguagem: passo-me completamente com os tipos!!! :)

    By Blogger Der Überlebende, at 2:25 AM  

  • Belo texto, Booklover, parabéns! Concordo inteiramente com a Perséfone, traduz muito bem esse sentimento de impotência perante o abandono que outros dedicam à sua vida, e nele podemos reconhecer tb os nossos próprios abandonos e desistências. Beijinhos!

    By Blogger smallworld, at 1:16 PM  

  • Não sei em concreto a kem t referes: é alguém consanguíneo ou é apenas alguém que apenas viste na rua, mas que sobeste a partir desse momento que é próximo de ti, ligado a ti, entranhado em ti?
    Não respondas...assim a magia não se desvanece.. foi essa incerteza de não saber quem é esse ser uno e, em simultâneo, apelativo e repelente que me fez lembrar alguém que conheci no verão passado. Digo "conheci" e acredito que não minto. nnca troquei com ele mais do que duas palavras sem nexo,mas olhando para ele e vendo o seu olhar cravado no meu, sei que o conheci.
    Era um alemão vadio e doido que vagueava pela rua da Junqueira na Póvoa. era alto e em novo foi com certeza um belo homem. deve ter agora os seus 55 anos.
    Contaram-me que era médico cirugião na Alemanha, um homem de sucesso até ao dia que nada pode fazer para salvar a mulher e a filha de um acidente fatal.
    a dor enlouqueceu-o. observei durante semanas a fio aquela dor. observei também a compaixão alheia: ajudavam-no porque tinham pena dele, gostavam dele porque tinham pena dele. eu gostei dele mas não tive pena, tive inveja: sei que nunca terei a nobreza de alma e a coragem desse herói que fez da loucura a sua arma, o seu baluarte, a sua defesa.
    Vi-o em Dezembro pela última vez... chovia miudinho. uma vizinha desceu à rua e tirou o casaco que envergava para o abrigar. ficava ridículo dentro daquele casaco fino, cintado, feminino. mas ao mesmo tempo, ficava excelsamente nobre. ele não gostava desse tipo de ajudas. axo que não queria que retardassem o seu momento de partir....

    By Anonymous Anonymous, at 2:31 PM  

  • desculpem a longinquidade deste comentário, mas não pude deixar de o fazer.

    By Anonymous Anonymous, at 2:33 PM  

  • Minha querida Marlene só vi agora o teu comentário... esta pessoa é de facto uma personagem criada por mim mas feita a partir de muitas pessoas conhecidas, de mim própria, do que observo... gostei muito da tua história, de te ler, falaremos melhor nas aulas
    beijinho

    By Blogger Eduarda Sousa, at 2:48 PM  

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