Luz e Sombra

Tuesday, February 14, 2006

Vida de Cão – Ilusão ,Desilusão, Realidade

Poochie era um cachorrinho. Na sua infância, ao lado dos sues três irmãozinhos, julgava-se extremamente fofinho. Ninguém tinha um pelo como ele, mais suave que a relva daquela vizinha rica, uns olhos melosos e matreiros que o levavam a conseguir tudo o que queria, as suas aptidões de caça, dignas de um cão adolescente, e a sua raça, rafeiro, inteligente e filho do povo, selvagem como a Deusa manda...
Sonhava que, um dia quando crescesse, e herdasse o território da sua família, conseguiria conquistar o terreno ao lado do talho àquele gordalhão do bulldog, que a dona abandonou por ser tão feio.

Seria um cão rico, oh sim, e respeitado... Multiplicaria a sua família por três, por quatro, não, por cinco vezes.
Teria muitas cadelas, para educar os seus filhos, seria um verdadeiro sultão.
Um a um todos os seu irmãozinhos eram levados, um atrás do outro. O seu irmão Bobby, é hoje um cão polícia, mas está a ficar velho. A Nina foi para a casa da vizinha rica, coitada, cortaram-lhe o pelo todo, e quase jurava tê-la visto com uma coisa cor-de-rosa felpuda agarrada às orelhas.
Mas o seu irmãozinho Snoopy foi o mais desgraçado, só conseguiu arranjar um emprego humilhante a guardar ovelhas. Se conhecêssemos o nosso pai, com certeza que ele iria ficar muito desiludido por saber que ele vive a proteger a caça.
Poochie sabia que com ele seria diferente, tinha de ser.
Com dois anos, era já um jovem cão, o seu pelo branco e felpudo fora substituído por um emaranhado seco com aspecto de pedra pomes, os seus olhos, ainda melosos, contrastavam enormemente com o seu aspecto magro e rafeiro.
Poochie amaldiçoava a Deusa por lhe ter tirado o bom aspecto. Não fora para isto que ele guardara religiosamente, todos os dias, o melhor osso para ela.
Com cinco anos, adulto, tentara a sua sorte ao perseguir o seu sonho. Estava a ficar magro e precisava de viver mais perto do alimento.
Barry o bulldog, deu-lhe uma grande tareia, e Poochie ficou coxo. Sem dúvida isto não estava a correr bem.
Tudo se complicara quando ele se apercebeu que nenhuma jovem cadela voltara a acasalar com ele. Já somente a velha Betsy se mostrava disponível, mas Poochie não queria parecer desesperado.
Resolvera emigrar.
Mudou-se para o quarteirão do parque, onde os humanos costumavam passear os seus amigos.
Hoje Poochie, com doze anos está velho, vivera o resto da sua vida sem ambição, vagueando pelo parque, comendo o que as pessoas gentilmente lhe ofereciam, fugindo todas as noites dos homens do canil, e a sua única conquista fora o pequeno refúgio por detrás dos arbustos onde vivia.
Vira novamente os seus irmãozinhos. O Bobby tivera um funeral de pompa e circunstância, com barulhos assustadores e humanos a deitar agua dos olhos.
A Nina, embora sua irmã gémea, mantera o seu pelo branco macio e bebia água de uma tigela prateada.
Até o Snoopy tivera um destino mais agradável, o seu dono mandara empalhá-lo, será para sempre uma estátua viva da sua memória.
É dura a realidade, porém irreversível.
Poochie enroscara-se no seu monte de folhas secas e adormecera.

1 Comments:

  • Acho que este texto dava um belo guião para uma 'curta' de animação, não propriamente para crianças, mas com um toque à lá Tim Burton

    continuação de boas escritas,
    d.u.

    By Blogger Der Überlebende, at 11:43 AM  

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