Luz e Sombra

Wednesday, April 20, 2005

Tempus Fugit (Parte II: A Dança dos Fantasmas); 500+500+500+500 palavras para um blog

Tempus Fugit (Parte II: A dança dos Fantasmas)
2:58h.
Mãe: Está frio, não saias à rua assim!
Eu: assim como?
Mãe: ...O cabelo todo molhado! Sempre o mesmo, depois eu é que me ralo para te tratar! Sempre me deste preocupações, parece que não sabes fazer mais nada na vida. Só estive sossegada contigo na barriga, desde que saíste começou o fadário. Quase homem feito já no 9º ano e ainda não sabe tratar de si mesmo... Não posso estar sempre preocupada contigo, vê se percebes! Ainda me matas desgraçado... (choraminga sem lágrimas)
Eu: (em surdina) ...se me permitisses talvez soubesse! Deves ter visto o fundo ao frasco de Valium hoje...

3:41h. (chorando compulsivamente) Eu não te odeio mãe, nunca te odiei...

O Audi A6 relaxa o passo e encosta. A berma desfocada da auto-estrada recolhe-o na hora antes do dealbar, no aconchego frígido da madrugada anónima que devora os incautos e alimenta os animais furtivos que se esgueiram entre os nossos medos e pensamentos. Os mortos irrompem dos seus leitos mortais por baixo do cobertor de asfalto.
4:07h. Deixei-me dormir! A clepsidra de lágrimas que me marca ritmo insiste em zombar de mim, em fazer da minha vontade inacção e da minha acção asneira. Suspiro, esfrego os olhos em inquieto desespero e dou à chave. 356Km depois estou mais longe do que antes de partir...

6:19h.
Pai: O miúdo, onde anda ele?
Mãe: Sei lá!? Não me chega já em casa durante toda a semana e agora até aqui na quinta dos teus irmãos tenho que ser eu a andar atrás dele?!?
Pai: Tem calma, em Outubro já vai para a escola, sempre é menos essa a preocupar-te...
Tia: Vai para uma pública ou privada?
Pai: públ...
Mãe: (interrompe irada) Privada! Vai para o liceu onde andou o meu pai. Foi lá que ele se fez homem e criou a estrutura moral e intelectual para abrir a empresa onde trabalhas, ou estás esquecido?!?....

6:50h.
Eu: Pai?
Pai: Sim filho, que foi?
Eu: ...nada, estou surpreso por te ver em casa tão cedo...
Pai: (os olhos ficam vermelhos, escorre suor da testa, a boca trava um sorriso nervoso) Nada meu amigo, não se passa nada, fica sossegado. Amanhã tens um exame, não é?
Eu: Sim, de Marketing. Gosto bastante daquilo, a professora é excelente! Ah, olha que tens um recado do avô no voice mail. Queres ouvi-lo?
Pai! Não (vira-se bruscamente e derruba uma jarra)! Foda-se! ... ai desculpa, desculpa-me filho, estou um bocado cansado, só isso...
Arrastou-se para fora da sala, apoiando-se nos móveis envernizados e limpos ad nauseum.

7:35. 701Km depois sou parado pela Brigada de Trânsito. Operação de rotina. Quando o GNR me pede os documentos desato num pranto desmedido. Como pode a vida ser tão irónica comigo?.. Porque fui eu obrigado a parar à entrada da ponte escolhida pelo meu pai para se enviar a ele, à minha mãe e ao carro do meu avô para dentro do rio e desaparecer da minha vida para sempre?


(...continua)

20 de Abril de 2005,

Der Uberlende

4 Comments:

  • Body count: 2

    Eh isto k eu kurto no O Berlinde (k lindo nome lol), limpa o sebo aos morcoes todos!!!

    da-lhe man, ixo eh k eh excrever!

    rapazsemblog

    By Anonymous Anonymous, at 1:16 AM  

  • ...and the plot thickens.
    Isto promete! Estou cada vez mais confusa em relação ao Fitipaldi.

    By Anonymous Anonymous, at 1:42 PM  

  • Sim, também eu criei logo de inicio antipatia pela personagem :) o que significa que me tocou, que entrou dentro de mim, que me provocou alguma coisa... poderá haver coisa melhor do que conseguir agarrar o leitor à trama?

    By Blogger Eduarda Sousa, at 3:25 PM  

  • Hmmm, agora tenho pena do fitipaldi, como lhe chama a earworm. LOL... Mau. Entao ele nao era um sacana? Ou ate os sacanas tem mae?... Estou cada vez mais curiosa em relacao ao destino deste personagem.

    By Blogger smallworld, at 10:21 PM  

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