DT Setembro: Um olhar sobre a calma; por Vera
E surge outra contribuição para o DT - Setembro!
Mais um post da Vera, que está em alta!
d.u.
Um olhar sobre a calma
O suave baloiçar embalava-a, com a suavidade da brisa de verão, mas o silêncio inquietava-a. Aquele escuro misterioso que a envolvia era triste e assustador. Lembrava-se ainda de, naquele dia, ter sentido aquela forte luz branca, tão intensa que feria, mas era uma felicidade, uma grande excitação de cores, um outro mundo por explorar. Hoje porém as cores esbatiam-se numa única cujo nome ela não sabia nem poderia reconhecer.
Quem seria aquele ser tão doce, cuja voz era bela e cristalina? Não o via...
Como era possível não o ver? Se ele estava ali... Tão perto e tão presente.
Bastava-lhe chorar, ou manifestar-se e ele vinha. Mas em vez de lhe mostrar as cores, a luz, tentava sempre acalmá-la alimentando-a ou limpando-a.
“Será que ninguém percebe que algo não está bem? Porque não me mostram as cores, e
me fazem feliz? Em breve perderei a esperança, desesperarei e algo terrível acontecerá...”
Porque estava ela a imaginar semelhante discurso para um bebé recém nascido?
Hoje com vinte anos tentava uma iluminação interior. Sempre se sentira assim? Conformada? Não, decerto que desde aquele primeiro momento em que vira a forte luz que questionara tudo e se sentira injustiçada. Era inútil, triste e desamparada. Não se podia considerar infeliz, mas...
Gostava que hoje todas aquelas perguntas ainda fizessem sentido, que ainda se importasse. Que o mundo das cores ainda lhe parecesse mágico. Mas não.
Ela conformara-se.
Os sons e as formas eram o mundo que ela conhecia. Dependia da ajuda de estranhos para se guiar, mas conseguira também alguma independência.Poderia haver pior pesadelo? Uma vida frágil e inútil, sem sonhos, objectivos ou sentido...
Vivia não por querer viver, mas porque estava viva. Era doloroso sair de casa todos os dias e viver a triste rotina. Queria Ter razões para ser triste. Queria chorar, importar-se, ouvir alguém troçar para poder indignar-se, tropeçar para poder levantar-se, ter uma razão para viver defendendo-se, já que (para ela) não lhe parecia ser possível ter uma melhor razão para viver.
Mas não tinha, então para quê viver?...
Vera
Mais um post da Vera, que está em alta!
d.u.
Um olhar sobre a calma
O suave baloiçar embalava-a, com a suavidade da brisa de verão, mas o silêncio inquietava-a. Aquele escuro misterioso que a envolvia era triste e assustador. Lembrava-se ainda de, naquele dia, ter sentido aquela forte luz branca, tão intensa que feria, mas era uma felicidade, uma grande excitação de cores, um outro mundo por explorar. Hoje porém as cores esbatiam-se numa única cujo nome ela não sabia nem poderia reconhecer.
Quem seria aquele ser tão doce, cuja voz era bela e cristalina? Não o via...
Como era possível não o ver? Se ele estava ali... Tão perto e tão presente.
Bastava-lhe chorar, ou manifestar-se e ele vinha. Mas em vez de lhe mostrar as cores, a luz, tentava sempre acalmá-la alimentando-a ou limpando-a.
“Será que ninguém percebe que algo não está bem? Porque não me mostram as cores, e
me fazem feliz? Em breve perderei a esperança, desesperarei e algo terrível acontecerá...”
Porque estava ela a imaginar semelhante discurso para um bebé recém nascido?
Hoje com vinte anos tentava uma iluminação interior. Sempre se sentira assim? Conformada? Não, decerto que desde aquele primeiro momento em que vira a forte luz que questionara tudo e se sentira injustiçada. Era inútil, triste e desamparada. Não se podia considerar infeliz, mas...
Gostava que hoje todas aquelas perguntas ainda fizessem sentido, que ainda se importasse. Que o mundo das cores ainda lhe parecesse mágico. Mas não.
Ela conformara-se.
Os sons e as formas eram o mundo que ela conhecia. Dependia da ajuda de estranhos para se guiar, mas conseguira também alguma independência.Poderia haver pior pesadelo? Uma vida frágil e inútil, sem sonhos, objectivos ou sentido...
Vivia não por querer viver, mas porque estava viva. Era doloroso sair de casa todos os dias e viver a triste rotina. Queria Ter razões para ser triste. Queria chorar, importar-se, ouvir alguém troçar para poder indignar-se, tropeçar para poder levantar-se, ter uma razão para viver defendendo-se, já que (para ela) não lhe parecia ser possível ter uma melhor razão para viver.
Mas não tinha, então para quê viver?...
Vera
2 Comments:
Tive que ler duas vezes para conseguir descobrir a cegueira. Fico na dúvida se a personagem também estará paralisada?!
Muito bem escrito, muito bem, tás em grande! só espero que não seja um caso verídico
beijinho
By Eduarda Sousa, at 2:20 PM
Olá todos...
Escrevi este texto depois de um cego me ter pedido ajuda no comboio, comoveu-me mas acima de tudo admirei-o pela sua força. “Ela” seria eu e esta é a minha versão de uma vida sem luz. Escrevi-o de forma confusa porque ele surgiu assim mesmo... numa única frase fluida sem pontuação, e convida-nos a diferentes interpretações. Fi-lo para ser vivido e não como leitura passiva. A minha interpretação é o debate filosófico de uma jovem adulta que sem nada porque lutar se deixa levar pela dor e pela solidão do escuro a que se habituara. Preferindo até sofrer para sentir emoção. Não quero desvendar muito mais porque é mais agradável imaginar, mas até hoje ninguém se apercebeu do desfecho final;) incitado pela frase “algo de terrível vai acontecer” e que completa o ciclo.
Obrigada por todos os comentários simpáticos que têm feito aos meus textos.
Em resposta a Booklover:) não é uma história verídica, é fruto da minha imaginação esperando tocar alguém para uma realidade tão presente...
By Musera, at 1:15 PM
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