Silêncio (Parte I); 500+500 palavras para um blog
Silêncio (Parte I)
214 pulsações por minuto: Não, esperem, por favor…NÃOOO!!
33 p.p.m.: O uivar distante das sirenes acompanha o fluir lento do sangue à minha cabeça. Tudo está desfocado e as pessoas e objectos movem-se descompassadamente como peixes em anóxia num aquário cheio de óleo em vez de água. As últimas memórias são de uma criança sentada a beira do lago a observar os círculos concêntricos feitos pelos ressaltos dos seixos aplanados a saltitar na superfície espelhada….
Onde estaria eu..?! Sentia-me gelado, mas a minha barriga e cabeça estavam a arder num remoinho húmido de lava e agonia. A criança esmorecia-se na paisagem cada vez menos definida, e o rasgão provocado pelas sirenes era cada vez mais intenso e inquietante.
92 p.p.m.:
Traficante: Sócio, como é?
Eu: ‘Tass bem man, comigo tás na boa não há espiga!
Traficante: Na tou a perceber bacano, ontem ouvi umas cenas que me deixaram bué à nora…
Eu: Man, tás-te a passar, deixa-te de ondas e orienta a merchandise…
Traficante: Vamos ali acertar umas contas… e parece que o russo quer ter uma conversinha contigo…
128 p.p.m.:
Eu: Man, tás passado dos cornos?!?
Traficante: Va, tá na altura de ajustar finanças…
Entendo finalmente onde estou. A porta das urgências era-me familiar, pois já tinha sido cliente dos gajos antes, tanto para me remendarem o couro como para receberem uns “clientes” meus com problemas de “saldo”
A lâmina do russo tinha trocado conhecimentos com a minha cara e estômago, e os punhos e as biqueiras de aço do meu “colega de serviço” trataram de me rearranjar a aparência. Estava feita a encomenda de mais uma caixa de pinho…
Onde estaria aquele chavalo, o puto que eu vi à beira do lago a espreitar as primas por entre as tábuas da casa dos barcos enquanto estas mudavam de roupa. O que seria feito daquele bacano que era o máximo, um músico de primeira apanha, sempre com a guitarra acústica cheia de autocolantes, sorrindo e piscando o olho às giraças da equipa de vólei. O que teria acontecido ao rapaz de olhos tristes que deambulava de bar em bar a entreter urbanóides desinteressados e desinteressantes com brasileiradas e golden oldies, torturando a pobre guitarra habituada a uma dieta de Floyd, Hendrix e Clapton com mediocridade só para pagar as contas… e o vício que entretanto se instalara nas narinas e veias de um corpo sub-nutrido…
61 p.p.m.:
O chiar dos travões das ambulâncias soavam-me aos chamamentos dos necrófagos para reunir à mesa.
Eu: Pai, eu seguro-te…
Pai: Deixa-me gaiato, antes que te parta as fuças!
Eu: Maldito seja o vinho e o dia em que nasceu, filho da p…!
Como um piloto de um caça num dia de festival, o meu incisivo voo de rompante pela sala…
49-122-218-87 p.p.m:
O mundo estava com dor de barriga e eu era o entrave. Deus olhava para baixo e acenava-me a despedida enquanto puxava o autoclismo. Próxima paragem: Lamber o enxofre das botas do meu verdugo
Animae, Libera me aex Inferis!
(...continua)
1 de Maio de 2005,
Der Uberlende
214 pulsações por minuto: Não, esperem, por favor…NÃOOO!!
33 p.p.m.: O uivar distante das sirenes acompanha o fluir lento do sangue à minha cabeça. Tudo está desfocado e as pessoas e objectos movem-se descompassadamente como peixes em anóxia num aquário cheio de óleo em vez de água. As últimas memórias são de uma criança sentada a beira do lago a observar os círculos concêntricos feitos pelos ressaltos dos seixos aplanados a saltitar na superfície espelhada….
Onde estaria eu..?! Sentia-me gelado, mas a minha barriga e cabeça estavam a arder num remoinho húmido de lava e agonia. A criança esmorecia-se na paisagem cada vez menos definida, e o rasgão provocado pelas sirenes era cada vez mais intenso e inquietante.
92 p.p.m.:
Traficante: Sócio, como é?
Eu: ‘Tass bem man, comigo tás na boa não há espiga!
Traficante: Na tou a perceber bacano, ontem ouvi umas cenas que me deixaram bué à nora…
Eu: Man, tás-te a passar, deixa-te de ondas e orienta a merchandise…
Traficante: Vamos ali acertar umas contas… e parece que o russo quer ter uma conversinha contigo…
128 p.p.m.:
Eu: Man, tás passado dos cornos?!?
Traficante: Va, tá na altura de ajustar finanças…
Entendo finalmente onde estou. A porta das urgências era-me familiar, pois já tinha sido cliente dos gajos antes, tanto para me remendarem o couro como para receberem uns “clientes” meus com problemas de “saldo”
A lâmina do russo tinha trocado conhecimentos com a minha cara e estômago, e os punhos e as biqueiras de aço do meu “colega de serviço” trataram de me rearranjar a aparência. Estava feita a encomenda de mais uma caixa de pinho…
Onde estaria aquele chavalo, o puto que eu vi à beira do lago a espreitar as primas por entre as tábuas da casa dos barcos enquanto estas mudavam de roupa. O que seria feito daquele bacano que era o máximo, um músico de primeira apanha, sempre com a guitarra acústica cheia de autocolantes, sorrindo e piscando o olho às giraças da equipa de vólei. O que teria acontecido ao rapaz de olhos tristes que deambulava de bar em bar a entreter urbanóides desinteressados e desinteressantes com brasileiradas e golden oldies, torturando a pobre guitarra habituada a uma dieta de Floyd, Hendrix e Clapton com mediocridade só para pagar as contas… e o vício que entretanto se instalara nas narinas e veias de um corpo sub-nutrido…
61 p.p.m.:
O chiar dos travões das ambulâncias soavam-me aos chamamentos dos necrófagos para reunir à mesa.
Eu: Pai, eu seguro-te…
Pai: Deixa-me gaiato, antes que te parta as fuças!
Eu: Maldito seja o vinho e o dia em que nasceu, filho da p…!
Como um piloto de um caça num dia de festival, o meu incisivo voo de rompante pela sala…
49-122-218-87 p.p.m:
O mundo estava com dor de barriga e eu era o entrave. Deus olhava para baixo e acenava-me a despedida enquanto puxava o autoclismo. Próxima paragem: Lamber o enxofre das botas do meu verdugo
Animae, Libera me aex Inferis!
(...continua)
1 de Maio de 2005,
Der Uberlende
2 Comments:
Another one bites the dust... Ehehehe. Adoro esta canção. Ja te disse o que penso sobre este texto, mas o meu full comment vira na parte 2. Um beijo e obrigada pela criatividade! As minhas horas vagas (e às vezes as não vagas também) não seriam o mesmo sem os teus textos e dos outros colaboradores neste blog.
By smallworld, at 9:34 AM
"O mundo estava com dor de barriga e eu era o entrave."
pois é, ultimamente é dificil manter-me actualizada no que diz respeito a este blog. o silencio parece que me persegue hoje. por vezes o silencio deixa-me louca.
Obrigada pelo carinho :)
beijo grande :*
By Perséfone, at 1:25 PM
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